Justiça não
basta — é preciso visibilidade e mobilização
Muitas pessoas ainda acreditam que, para que
uma reivindicação seja atendida, basta que ela seja justa. Isso é um engano. No
mundo atual, marcado pela sobrecarga de informações e disputas de atenção, a
justiça da causa precisa vir acompanhada de mobilização estratégica,
visibilidade pública e pressão social coordenada, principalmente usando as
redes digitais.
Se uma causa justa não tiver apoio,
engajamento e capacidade de mobilizar aliados, ela será ignorada, mesmo
que seu conteúdo seja legítimo. Isso vale tanto no espaço físico quanto nas
redes sociais.
Um exemplo
que ainda se repete
Imaginemos um caso: moradores de um bairro
periférico se organizam para exigir que a empresa de ônibus cumpra o itinerário
completo, inclusive em dias de chuva, quando os coletivos deixam de passar por
uma rua sem pavimentação, obrigando os moradores a caminhar quase um quilômetro
até o ponto mais próximo. A cobrança é legítima: se o preço da passagem não
muda, o serviço prestado também não deveria mudar.
No entanto, ao buscar diálogo, a comissão de
moradores é ignorada tanto pela empresa quanto pela Secretaria de Transportes.
Pior: o dono da empresa, com influência política, acusa o grupo de
“agitadores”, gerando intimidações policiais. Isso gera medo, esvazia a
mobilização e o movimento acaba se desfechando.
A causa era justa. Mas faltou força
organizada e visibilidade pública. Faltaram aliados. Faltou, também, uma
estratégia de comunicação e articulação em rede que protegesse o movimento e
amplificasse sua voz.
- Antes
de iniciar uma mobilização, o grupo precisa fazer um bom mapeamento de
suas forças reais e potenciais, incluindo presença nas redes
sociais, apoio comunitário, parcerias com organizações e ativistas
influentes.
- Esse
diagnóstico não deve ficar nas mãos de uma única pessoa ou grupo restrito.
Quanto mais participativo for o processo, mais legítima será a mobilização
— e mais chances ela terá de gerar engajamento digital e presencial.
Toda campanha reivindicatória exige seriedade.
Pode trazer resultados excelentes — como conquistas concretas, fortalecimento
da consciência coletiva, formação de novas lideranças — mas também pode causar
frustrações, dispersão e desmobilização se for mal planejada.
Por isso, antes de ir às redes ou à rua, é
necessário responder a perguntas estratégicas:
- Temos
base de apoio suficiente?
- Há
influenciadores locais ou comunitários dispostos a divulgar nossa causa?
- Conseguimos
produzir conteúdos (vídeos curtos, imagens, textos) que viralizem ou
sensibilizem?
- Estamos
preparados para lidar com possíveis ataques digitais ou tentativas de
deslegitimar o movimento?
Hoje, a força política também se mede em
alcance, engajamento e capacidade de narrar sua própria história nas redes.
Se, ao avaliar sua força, o grupo perceber que
ainda não tem capacidade suficiente para enfrentar um poder estabelecido, isso
não deve gerar desânimo.
A força se constrói. É possível começar com
ações menores, que aumentem a visibilidade, fortaleçam vínculos comunitários
e engajem aliados digitais.
Algumas estratégias eficazes nesse sentido
são:
- Campanhas
de escuta ativa (enquetes, fóruns online, reuniões
públicas) para mapear demandas reais da comunidade.
- Produção
de conteúdo informativo para esclarecer a população sobre seus
direitos e a legitimidade da causa.
- Parcerias
com coletivos, ONGs, jornalistas independentes e criadores de conteúdo que
possam amplificar a voz do movimento.
- Organização
de eventos simbólicos (lives, caminhadas, abaixo-assinados
digitais) que marquem presença e gerem mídia espontânea.
Não há fórmula exata, mas alguns indicadores
podem guiar essa análise estratégica, tanto no mundo físico quanto digital:
- A
causa tem aderência real? É sentida por muitos ou só por um pequeno
grupo?
- Os
moradores já se envolveram antes em outras lutas ou será a primeira
mobilização?
- Quem
lidera é confiável, conhecido e respeitado?
- O
grupo tem acesso a canais de comunicação, como grupos de WhatsApp,
páginas no Instagram ou parcerias com páginas populares da região?
- Há
adversários poderosos? Esses adversários controlam redes, jornais locais
ou políticos influentes?
- Existem
divisões internas ou rivais tentando disputar a narrativa? Como
evitar que o movimento seja cooptado ou difamado?
- Temos aliados
fortes — dentro ou fora do bairro — que podem reequilibrar essa
disputa?
Essas perguntas precisam ser debatidas com
calma e profundidade, inclusive com apoio externo qualificado: comunicadores
populares, advogados, educadores, movimentos sociais experientes.
O novo
campo de batalha é também digital
A luta popular não acontece mais apenas na
praça, na assembleia ou no sindicato. Ela acontece também no Instagram, no
TikTok, no YouTube, nas newsletters, nas hashtags e nos aplicativos de
mensagem.
Uma comissão isolada pode ser facilmente
ignorada ou atacada. Mas uma mobilização que combina ação comunitária com
estratégia digital tem muito mais chance de:
- desencadear
pressão social ampla,
- fugir
do isolamento,
- resistir
à criminalização, e
- criar
uma rede de solidariedade capaz de sustentar a luta.
- Se
você fosse um dos moradores do bairro enfrentando a empresa de ônibus, como
adaptaria a mobilização ao ambiente digital? Criaria uma página? Faria
vídeos? Buscaria apoio de influenciadores?
- Dê
três exemplos de lutas populares contemporâneas cuja vitória exigiu uso
inteligente das redes sociais para gerar força e apoio.
- Quais
são os cuidados éticos que um grupo deve ter ao mobilizar digitalmente?
Como evitar desinformação, exposição excessiva ou exclusão de quem não
está conectado?
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