Este é o segundo artigo sobre o assunto. Procurei fazê-lo mais didático que o anterior.
A filosofia estoica sustenta que a natureza
nos estabeleceu o objetivo de florescer, tornando-nos homens e mulheres bons.
De acordo com Musônio Rufo, "ser bom é a mesma coisa que ser um
filósofo", ou seja, um amante da sabedoria (Palestras, 16). Dentro desta
perspectiva, ser sábio e ser bom são essencialmente a mesma coisa. No entanto,
surge uma questão fundamental: qual é a verdadeira natureza do "bem"
que o sábio contempla e que define seu estado de espírito? Para responder a
essa pergunta, devemos compreender a distinção estoica entre o que é bom, mau e
indiferente.
A tríade
estoica: bem, mal e indiferença
Os estoicos, seguindo os ensinamentos de
Zenão, classificaram os elementos da existência em três categorias:
- Coisas
boas: Incluem sabedoria, temperança, justiça,
coragem e todas as virtudes.
- Coisas
ruins: Compreendem a tolice, intemperança,
injustiça, covardia e todos os vícios.
- Coisas
indiferentes: Englobam elementos como vida, fama,
riqueza, saúde, dor e prazer. Embora possuam valor relativo, não são
verdadeiramente "boas" ou "ruins".
Dessa maneira, os estoicos argumentam que o
verdadeiro bem está na virtude, enquanto os elementos materiais e contingentes
da vida são apenas circunstanciais e não devem ser confundidos com o propósito
fundamental da existência humana.
A perfeição
da natureza humana
Para os estoicos, o bem é aquilo que está em
perfeita harmonia com a natureza racional do ser humano. Conforme Cícero
relata, o estoico Díogenes da Babilônia definiu o bem como "o que é
completo pela Natureza", ao passo que Catão descreveu a sabedoria como
sinônimo de maturidade e completude (De Finibus, 4.37). Dessa forma, ser
virtuoso não é apenas um imperativo moral, mas também o cumprimento do
potencial pleno do ser humano.
A palavra grega "aretê",
frequentemente traduzida como "virtude", significa
"excelência". Assim, um ser humano alcança seu objetivo quando
desenvolve ao máximo sua razão e sua capacidade de agir com justiça. Esse
desenvolvimento não depende da riqueza, da saúde ou da longevidade, mas apenas
do progresso moral.
A ilusão do
bem material
Os estoicos sustentam que a humanidade está
envolta em uma grande ilusão (tuphos), uma "fumaça" que nos faz
acreditar que riqueza, poder e prazer são intrinsecamente bons. No entanto,
tais bens são apenas preferíveis dentro de um contexto prático, mas não
determinam o valor moral de um indivíduo. Dessa forma, alguém pode ser rico e
infeliz, enquanto outro pode ser pobre e virtuoso, alcançando a verdadeira
felicidade estoica.
Essa distinção também explica a indiferença
estoica à morte. Catão, por exemplo, rejeitou a ideia de que prolongar a vida
seja um bem em si mesmo, pois o valor da vida reside na virtude, não na sua
duração (De Finibus, 3.46). O que realmente importa é atingir a perfeição
moral, independentemente do tempo de vida que nos resta.
As características
do bem
Os primeiros estoicos atribuíram diversas
qualidades à natureza do bem, como relatado por Díogenes Laércio e Estobeu:
- Benéfico: O
bem promove a prosperidade do indivíduo e da coletividade.
- Vantajoso: Leva
à verdadeira felicidade (eudaimonia).
- Honrado
e belo (kalos): A virtude é intrinsicamente louvável e
harmoniosa.
Segundo Epicteto, a virtude é também
"liberdade", pois liberta o indivíduo dos medos e desejos
irracionais, enquanto o vício equivale à escravidão.
Para os estoicos, a natureza do bem é
inseparável da virtude. Somente a sabedoria, a justiça, a temperança e a
coragem podem levar o ser humano à felicidade autêntica. Os bens materiais e
circunstanciais, embora possam ter algum valor prático, são indiferentes quando
comparados à perfeição moral. Assim, o verdadeiro desafio não é acumular
riqueza ou poder, mas sim desenvolver a excelência da alma, cumprindo
plenamente nossa natureza racional e social. Este é o caminho para a
eudaimonia, o florescimento humano segundo a razão e a virtude.
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