Métodos da Ciência Política: Ferramentas para a Verdade e a Compreensão

 

No vasto campo do conhecimento científico, a busca pela verdade não se limita apenas ao resultado final de uma investigação; o caminho percorrido para alcançá-la, ou seja, o método, é igualmente crucial. Em certo sentido, a validade e a confiabilidade do conhecimento obtido dependem intrinsecamente do rigor e da adequação dos métodos empregados pelo cientista. Na ciência política, essa premissa ganha ainda mais relevância, dada a complexidade e a natureza multifacetada de seu objeto de estudo.

O método (do grego methodos, que significa "caminhando ao longo do caminho" ou "escolhendo o caminho certo") pode ser definido como um sistema de regras e técnicas para estudar quaisquer objetos a fim de encontrar a verdade objetiva. Ele fornece uma estrutura sistemática para a observação, a coleta de dados, a análise e a interpretação, garantindo que a pesquisa seja realizada de forma lógica, coerente e verificável.

Os métodos de pesquisa política podem ser categorizados em três grandes grupos, que atuam de forma complementar e interligada:

  • Métodos Lógicos Gerais: São métodos universais de cognição científica, desenvolvidos no âmbito da filosofia (teoria do conhecimento), aplicáveis tanto na cognição teórica quanto empírica em diversas disciplinas.
  • Métodos de Pesquisa Teórica: Envolvem abordagens e modelos conceituais para construir explicações sobre fenômenos políticos complexos.
  • Métodos de Seleção de Dados Empíricos: Referem-se às técnicas específicas para coletar informações e evidências do mundo real.

Este artigo se aprofundará em cada um desses grupos, explorando suas particularidades, aplicações na ciência política e a interrelação entre eles.

 1. Métodos gerais de cognição científica

Os métodos lógicos gerais são as ferramentas cognitivas mais básicas e fundamentais, subjacentes a toda investigação científica. Eles fornecem a estrutura mental pela qual os cientistas organizam e processam informações, independentemente da disciplina específica.

1.1. Abstração

A abstração é talvez a técnica cognitiva mais comum e universalmente empregada em todas as ciências. No processo de abstração, o pesquisador fixa mentalmente alguma propriedade essencial e importante de um objeto em uma determinada situação cognitiva, abstraindo-se de todas as outras propriedades. O propósito dessa "distração mental" é simplificar a situação, isolar variáveis ou características específicas e estudar processos em sua forma mais pura ou concentrada.

Por exemplo, ao estudar o conceito de "poder político", um cientista político pode abstrair-se das particularidades de um líder específico ou de um país em particular e focar nas características essenciais da capacidade de influenciar decisões ou alocar recursos na sociedade. O resultado da abstração é a criação de abstrações, conceitos de um certo nível e propósito, que permitem a generalização e a construção de teorias. Essas abstrações formam os blocos de construção do conhecimento teórico, permitindo que a mente humana lide com a complexidade do mundo ao reduzir fenômenos intrincados a seus elementos mais cruciais.

1.2. Análise e Síntese

Intimamente relacionados à abstração, os métodos de análise e síntese são operações cognitivas complementares e interdependentes:

  • Análise: É a divisão sequencial de um objeto integral em subsistemas e elementos com o propósito de seu estudo abrangente. Na ciência política, isso pode significar decompor um sistema político em seus subsistemas (executivo, legislativo, judiciário), ou um processo eleitoral em suas etapas (formação de partidos, campanhas, votação, contagem). A análise permite examinar as partes de um todo em detalhe, entendendo suas características intrínsecas e como elas operam individualmente.
  • Síntese: É a unificação mental de partes previamente selecionadas de um objeto em um sistema de conhecimento teórico. Após analisar os componentes, a síntese recombina essas partes para compreender como elas interagem e formam um todo coeso e funcional. Por exemplo, após analisar as funções de cada poder em um governo, a síntese buscaria entender como a interconexão desses poderes contribui para a governabilidade e a estabilidade democrática. Análise e síntese são um ciclo contínuo na pesquisa, onde cada uma serve de premissa para a outra, revelando a complexidade do objeto de estudo.

1.3. Indução e Dedução

A análise e a síntese estão, por sua vez, associadas aos métodos de indução e dedução, que representam os dois principais caminhos lógicos para a inferência científica:

  • Indução: É um método de pesquisa e um método de raciocínio no qual a conclusão geral é construída com base em premissas particulares. Na ciência política, isso significa observar uma série de eventos ou comportamentos específicos (dados empíricos) e, a partir deles, inferir uma generalização ou um padrão. Por exemplo, se observamos que em vários países com altos níveis de desigualdade social, há uma maior incidência de protestos sociais, podemos induzir uma hipótese geral sobre a relação entre desigualdade e instabilidade. O resultado indutivo é sempre incompleto e probabilístico; as conclusões são prováveis, mas não garantidas, pois se baseiam em uma amostra de observações.
  • Dedução: É um método de investigação e um método de raciocínio por meio do qual uma conclusão particular decorre de premissas gerais de acordo com as leis da lógica. Aqui, partimos de uma teoria ou hipótese geral e a aplicamos a casos específicos para testar sua validade. Por exemplo, se uma teoria geral postula que a democracia é mais estável em países com forte classe média, podemos deduzir que um país com essas características tem maior probabilidade de manter sua democracia. A dedução, se as premissas forem verdadeiras e a lógica for válida, leva a conclusões certas. A indução é essencial para a formação de hipóteses, enquanto a dedução é crucial para seu teste e refinamento.

1.4. Analogia

A analogia (correspondência, semelhança) é um método de cognição no qual, com base na semelhança de objetos em algumas características, eles concluem sobre sua semelhança em outras características. Na ciência política, a analogia permite transferir conhecimentos ou entendimentos de um domínio para outro. Por exemplo, pode-se usar uma analogia biológica para descrever o funcionamento de um sistema político (onde as "partes" do corpo seriam as "instituições" do sistema). Ou, pode-se comparar a dinâmica de negociação em um conselho municipal com a de uma reunião internacional, inferindo que princípios de barganha se aplicam em ambos os contextos. A analogia é útil para gerar novas ideias e hipóteses, mas requer cautela, pois nem todas as semelhanças superficiais indicam relações profundas ou causais.

1.5. Modelagem

A modelagem é o estudo de um objeto (original) criando e estudando sua cópia (modelo) que substitui o original em determinados aspectos de interesse do pesquisador. Modelos podem ser físicos, gráficos, conceituais ou matemáticos. Na ciência política, a modelagem é frequentemente usada para simplificar a realidade complexa, isolar variáveis-chave e simular processos. Por exemplo, a teoria dos jogos cria modelos matemáticos de interações estratégicas entre atores para prever resultados. Mapas eleitorais são modelos gráficos que representam a distribuição geográfica do voto. Modelos teóricos da democracia representam idealizações de como um sistema democrático deveria funcionar. A modelagem permite que os cientistas manipulem variáveis e cenários de forma controlada, o que seria impossível ou antiético na realidade.

1.6. Classificação

A classificação é a divisão de todos os objetos em estudo em grupos separados, de acordo com algumas características que são importantes para o pesquisador. Na ciência política, a classificação é ubíqua. Governos são classificados em democracias, autocracias, monarquias; sistemas partidários em bipartidários, multipartidários; ideologias em liberais, conservadoras, socialistas. A classificação organiza o vasto e diversificado mundo dos fenômenos políticos, tornando-o mais compreensível e manejável para análise comparativa e generalização teórica. Uma boa classificação deve ser exaustiva (todos os objetos cabem em alguma categoria) e mutuamente exclusiva (nenhum objeto se encaixa em mais de uma categoria).

1.7. Métodos Teóricos Superiores (Principalmente no Nível de Cognição Teórica)

Existem métodos lógicos gerais que são utilizados predominantemente no nível da cognição teórica, focando na construção de constructos conceituais e na reconstrução da essência dos fenômenos:

  • Método Histórico e Lógico: Este par de métodos é crucial para entender o desenvolvimento dos fenômenos políticos.
    • O método histórico envolve a descrição da história factual do desenvolvimento dos objetos em toda a sua diversidade. Ele traça a trajetória real dos eventos, instituições e ideias ao longo do tempo.
    • O método lógico é uma reconstrução mental da história de um objeto, livre de acidentes e detalhes insignificantes, revelando a lógica objetiva de seu desenvolvimento. Enquanto o método histórico se preocupa com o "como aconteceu", o método lógico busca o "porquê" por trás da sequência de eventos, identificando as forças motrizes e os princípios subjacentes. Juntos, eles permitem uma compreensão mais profunda da evolução política, separando o essencial do acidental.
  • Idealização: É o processo mental de criar objetos ideais, alterando as propriedades de objetos reais no processo de transição limitante. Nesse caso, uma propriedade é considerada absoluta. Na ciência política, a idealização é fundamental para a construção de "tipos ideais" (como a "democracia liberal" ou a "burocracia weberiana"), que servem como pontos de referência conceituais. Eles não existem perfeitamente na realidade, mas ajudam a analisar e comparar os sistemas políticos reais, compreendendo suas variações em relação ao ideal. Um "eleitor racional", por exemplo, é uma idealização.
  • A Ascensão do Abstrato ao Concreto: Este método se refere a uma reprodução mental e teórica da essência do objeto em estudo. Começa-se com abstrações simples (conceitos gerais), move-se para categorias mais complexas e interconectadas, e finalmente retorna a uma compreensão rica e multifacetada do objeto real (o "concreto"), mas agora com uma profundidade teórica que antes não existia. É um processo de elaboração conceitual que culmina em uma teoria abrangente que captura a complexidade do fenômeno político.

1.8. O Caráter Orientado por Valores e a Estrutura da Pesquisa em Ciência Política

Uma característica distintiva das ciências sociais, incluindo a ciência política, é seu caráter orientado por valores, que afirma a natureza axiológica dos fatos políticos. Ao contrário das ciências naturais, onde a separação entre observador e observado, e entre fatos e valores, é mais direta, na ciência política, os valores do pesquisador e os valores inerentes aos próprios fenômenos políticos (justiça, liberdade, igualdade) são inescapáveis.

Considerando essa dimensão axiológica, a estrutura ideal da pesquisa em ciência política, conforme J. Galtung e outros, integra valores e dados empíricos na construção da teoria. A investigação deve incluir tanto a coleta de dados quanto a reflexão sobre valores, culminando em resultados expressos em teoria. A sequência lógica de operações seria:

  1. Formulação de hipóteses e elaboração do estudo: Definir perguntas e pressupostos iniciais.
  2. Correlação de hipóteses com valores: Reconhecer e explicitar como os valores (tanto do pesquisador quanto os intrínsecos ao fenômeno) influenciam a formulação das hipóteses e a escolha do objeto de estudo.
  3. Testar hipóteses com dados empíricos: Coletar e analisar evidências do mundo real para verificar a validade das hipóteses.
  4. Generalização de dados empíricos: A partir dos dados específicos, buscar padrões e tendências que permitam formulações mais amplas.
  5. Conclusões, teoria: Construir um corpo de conhecimento sistemático que explique os fenômenos observados e teste as hipóteses.
  6. Determinação da esfera de verdade da teoria: Estabelecer os limites, as condições e o escopo sob os quais a teoria é válida.
  7. Correlação da teoria com os valores, crítica das relações sociais e políticas existentes, definição de problemas, formulação de formas de resolvê-los com base na teoria: Este é o estágio mais crucial para a relevância da ciência política. A teoria não deve ser um fim em si mesma, mas uma ferramenta para avaliar a realidade política, identificar problemas sociais e políticos e propor soluções baseadas no conhecimento obtido.

É essencial enfatizar que a teoria (do grego theoria, que significa "visão", "contemplação") é a forma mais elevada de conhecimento. O método é o principal meio de construção de modelos teóricos destinados a explicar as características essenciais dos processos políticos. A escolha e aplicação dos métodos de pesquisa em ciência política dependem da compreensão das especificidades do objeto de cognição, sua estrutura e a lógica da pesquisa. A correta correlação dos níveis teórico e empírico de análise, e sua integração, torna-se um importante problema metodológico para obter novos conhecimentos sobre o tema. Assim, métodos empíricos e teóricos são distinguidos de acordo com a estrutura do conhecimento científico e as duas etapas da pesquisa: empírica e teórica.

 2. Métodos teóricos em ciência política

Os métodos teóricos na ciência política buscam construir explicações sistemáticas e abrangentes para os fenômenos políticos, indo além da mera descrição. Eles operam no nível da conceituação e da formulação de modelos explicativos. A complexidade e multidimensionalidade dos objetos políticos frequentemente exigem a combinação de vários métodos.

2.1. O Método do Sistema

O método do sistema ocupa atualmente um dos lugares de liderança no conhecimento científico em geral e na ciência política em particular. É amplamente utilizado no estudo de objetos complexos em desenvolvimento, multinível e, via de regra, auto-organizados, como são os objetos políticos.

Um sistema é um conceito científico geral que expressa um conjunto de elementos que estão em relações e conexões entre si e com o meio ambiente e formam uma certa unidade. Na abordagem sistêmica, um objeto é considerado como um conjunto de elementos cuja interconexão determina as propriedades integrais de um determinado conjunto.

David Easton é um dos grandes nomes da teoria de sistemas na ciência política. Sua abordagem do "sistema político" o descreve como um sistema aberto que recebe "inputs" (demandas e apoio da sociedade), os processa e gera "outputs" (políticas públicas, decisões), que por sua vez geram "feedback" que afeta os inputs futuros.

Ao considerar objetos políticos complexos do ponto de vista da metodologia da abordagem sistêmica, é possível revelar as diversas conexões e relações dentro do próprio objeto (subsistemas, elementos) e sua conexão com o ambiente externo, bem como a influência do ambiente nas características do objeto em estudo. Assim, o método do sistema orienta os pesquisadores a considerar os processos e fenômenos políticos como entidades sociais abertas e autorreguladoras que interagem constantemente com o ambiente externo.

O método do sistema baseia-se no uso de métodos lógicos gerais como:

  • Análise: A decomposição do todo do sistema em componentes (subsistemas, componentes, elementos) de diferentes níveis de complexidade. Por exemplo, analisar o sistema político brasileiro dividindo-o em subsistemas (legislativo, executivo, judiciário, partidário, eleitoral).
  • Síntese: A consideração das propriedades integrais do todo, que seus elementos constituintes não possuem isoladamente. Por exemplo, a capacidade de um sistema político em manter a estabilidade democrática é uma propriedade do todo, não de um único partido ou instituição.

2.2. Análise Estrutural-Funcional

A análise estrutural-funcional como método teórico de cognição tem certa semelhança com a abordagem sistêmica, mas com um foco particular. Ela se concentra em identificar os componentes do sistema como um fenômeno integral (análise estrutural) e, crucialmente, na análise funcional do objeto.

  • Análise Estrutural: Lida com a "morfologia" do objeto em estudo, compilando um "registro" de seus elementos (detalhes) e conexões estáveis e reprodutíveis entre eles. Por exemplo, descrever a estrutura de um partido político: seus órgãos de decisão, hierarquia, regras internas.
  • Análise Funcional: É a especificidade e a característica distintiva desse método. O estudo funcional de um objeto (em particular, o político) pressupõe uma análise de seu funcionamento, dos mecanismos de reprodução da integridade política (o objeto como sistema). Não se reduz exclusivamente à análise das funções individuais de suas partes, mas pressupõe a correlação mútua dessas funções, a conexão ao longo da linha parte-parte (como o legislativo interage com o executivo), que não coincide com a conexão ao longo da linha parte todo (esta última é mais característica da abordagem sistêmica). Além disso, a análise funcional revela a forma de interconexão dos elementos do objeto, sua influência mútua, o que garante a reprodução da integridade.

Os elementos do sistema político em sua totalidade compõem a estrutura complexa da esfera política da vida pública e determinam o desempenho de certas funções no âmbito do todo social, a principal das quais é a função de alcançar objetivos comuns para a sociedade (como manter a ordem, alocar recursos, resolver conflitos). Gabriel Almond e James Coleman, por exemplo, aplicaram o funcionalismo estrutural para analisar as funções universais desempenhadas por diferentes estruturas políticas em diversos países.

2.3. O Método Comunicativo Cibernético

O método comunicativo cibernético permite estudar a política através do prisma dos fluxos de informação construídos sobre o princípio da conexão reversa (feedback) e de uma rede de ações e mecanismos comunicativos intencionais que garantem as relações entre aqueles que governam e são gerenciados em todos os níveis das relações dentro da sociedade e com o ambiente externo.

Inspirado na cibernética (o estudo de sistemas de controle e comunicação), essa abordagem vê a política como um processo contínuo de troca de mensagens, interpretação e resposta. Os métodos da abordagem comunicativa exigem revelar as propriedades da política por meio do estudo das formas de comunicação entre as pessoas que estão surgindo no espaço político, os contatos significativos que se formam entre elas, a negociação de significados e a construção de consenso ou conflito através da linguagem e dos símbolos. É a base para estudos sobre opinião pública, propaganda, retórica política e o papel da mídia. Karl Deutsch foi um pioneiro nesse campo, aplicando conceitos cibernéticos à análise do sistema político como um sistema de comunicação e aprendizado.

2.4. O Método de Comparação (Comparativo)

O método de comparação é uma operação cognitiva baseada em julgamentos sobre a semelhança ou diferença de objetos. Com a ajuda da comparação, suas características qualitativas e quantitativas são reveladas. A principal condição para o uso desse método é a presença de uma base comum (característica) pela qual os objetos em estudo são comparados. As características a serem identificadas devem ser essenciais para essa consideração, e os objetos comparados por um critério podem não ser comparáveis por outro. Os sinais podem ter uma forma de conteúdo ou natureza funcional. Por exemplo, o estudo das características específicas de certas instituições políticas só é possível com base nas propriedades gerais dessas instituições.

  • Método Histórico-Comparativo: Uma das variedades mais difundidas do método de comparação é o método histórico-comparativo. Com sua ajuda, são conhecidos vários estágios de desenvolvimento de um mesmo fenômeno (por exemplo, de um estado) ou fenômenos coexistentes que têm uma certa base comum. Baseado neste método, é possível identificar e comparar os níveis e determinar as tendências no desenvolvimento do fenômeno em estudo, as mudanças ocorridas. Em particular, é útil no estudo das formas de estado como um fenômeno em desenvolvimento, pois nos permite identificar os principais estágios de seu desenvolvimento e refletir sua evolução. Este método pode ser visto como uma ponte entre os métodos históricos e os comparativos.

 3. Métodos empíricos em ciência política

Os métodos empíricos são as ferramentas para a coleta de dados primários e secundários, permitindo que os cientistas políticos testem suas hipóteses e construam teorias baseadas em evidências do mundo real.

3.1. Observação

A forma mais simples e acessível de coletar informações é a observação, que é entendida como o registro direto de fenômenos e processos sociais por uma testemunha ocular. É frequentemente usada para estudar formas de comportamento de protesto: mítines, manifestações, greves, etc. Seu uso permite realizar "reconhecimento" e refinar métodos para pesquisas mais detalhadas e aprofundadas.

Para que a observação seja eficaz e minimamente tendenciosa, ela requer:

  • Objetivos de pesquisa corretamente formulados, de acordo com os quais é conduzida.
  • Cumprimento das regras de seleção do procedimento de observação (por exemplo, observação participante ou não participante, estruturada ou não estruturada).
  • Registro correto das qualidades do objeto observado, com uso de diários de campo, checklists ou sistemas de codificação.

As desvantagens significativas desse método são sua limitação à estrutura de um único objeto (o que dificulta a generalização) e a subjetividade da percepção do observador. Portanto, pesquisadores experientes são muito cautelosos ao generalizar os dados obtidos usando esse método de pesquisa, frequentemente utilizando-o como uma etapa exploratória ou complementar a outros métodos.

3.2. Análise Documental

A análise documental é um método amplamente utilizado para coletar informações primárias. Os cientistas consideram qualquer informação registrada como um documento. Isso pode incluir textos, manuscritos, livros, periódicos, fotografias, filmes, gravações magnéticas, arquivos de computador, relatórios orais, dados estatísticos, etc.

  • Tipos de Documentos por Status:
    • Oficiais: Incluem instruções administrativas, ordens, decretos, leis, informações estatísticas, atas de reuniões, discursos oficiais.
    • Não Oficiais: Como arquivos pessoais, diários, memórias, cartas, registros informais.
  • Tipos de Documentos por Fonte:
    • Primários: Nos quais os eventos são registrados diretamente (registros originais, resultados de observações brutas, transcrições de entrevistas).
    • Secundários: Que são uma generalização dos dados obtidos de documentos primários (relatórios de pesquisa, conclusões oficiais, informações estatísticas compiladas, artigos de revisão).

Na análise dos documentos, são levados em consideração: o grau de autenticidade e confiabilidade, os motivos dos criadores dos documentos (quem o escreveu, para quem, com que propósito), e as condições para sua compilação (contexto histórico, político).

Análise de Conteúdo

Na ciência política, juntamente com outras ciências sociais, é usado um método de análise de documentos como a análise de conteúdo. Em um sentido amplo, a análise de conteúdo é uma característica quantitativa e qualitativa das unidades de texto (palavras, símbolos semânticos, expressões, temas, frases, parágrafos), a determinação de dependências entre elas e a identificação de fragmentos de significado semelhante.

Existem abordagens quantitativas e qualitativas para a análise de conteúdo:

  • A abordagem qualitativa está focada em identificar a autoria, objetivos e condições para a criação do texto, buscando as nuances e os significados profundos.
  • A abordagem quantitativa é baseada na relação estatística de uma unidade de texto, na frequência de seu uso e na ordem de sua disposição, permitindo a contagem e a análise sistemática de padrões.

A primazia no desenvolvimento do método de análise de conteúdo é frequentemente atribuída ao cientista político americano Harold Lasswell. Com sua ajuda, são investigadas as comunicações, as atitudes de massa e a consciência individual, as imagens de vários fenômenos (por exemplo, como a mídia retrata um político ou um evento), a propaganda e o discurso político.

3.3. Método de Avaliação de Especialistas

O método de avaliação de especialistas é um dos métodos de pesquisa mais comuns, especialmente quando as informações são escassas ou o fenômeno é complexo demais para ser totalmente capturado por dados quantitativos. Sua essência é identificar as opiniões dos especialistas mais autorizados em um determinado campo sobre uma determinada situação, as razões de sua origem ou prever o desenvolvimento de eventos.

O grau de autoridade de um especialista é determinado com base na frequência de menções de seu nome em círculos profissionais, trabalhos científicos e opiniões de seus colegas. As técnicas para coletar informações de especialistas incluem:

  • Entrevistas em profundidade: Conversas estruturadas ou semi-estruturadas com especialistas para obter insights detalhados.
  • Discussões públicas organizadas entre especialistas: Mesas-redondas, painéis ou conferências onde especialistas debatem um tema.
  • Método Delphi: Um processo estruturado para obter e refinar opiniões de um grupo de especialistas através de várias rodadas de questionários anônimos e feedback, buscando um consenso.

Este método é valioso para cenários prospectivos, análise de riscos e para preencher lacunas de dados empíricos diretos.

3.4. Método de Pesquisa (Survey)

O método de pesquisa (survey) é muito popular entre os cientistas políticos, pois permite estudar as características objetivas e subjetivas do objeto em estudo, como atitudes, crenças, comportamentos reportados e dados demográficos.

A pesquisa como método de pesquisa social e política começou a ser amplamente utilizada na década de 30 do século XX, com figuras como George Gallup revolucionando o campo. Suas previsões eleitorais baseadas em pesquisas eram altamente precisas e uma sensação científica, demonstrando o potencial de generalização desse método.

Realizar uma pesquisa e processar seus resultados é uma tarefa complexa que requer o cumprimento de certas regras e procedimentos. Os dados obtidos podem ser distorcidos se os princípios básicos da preparação e condução da pesquisa não forem seguidos. O mais importante deles é o princípio da amostragem correta. Entende-se por amostra uma parte da população em estudo, que possui as mesmas características e características da população em geral, garantindo que os resultados da amostra possam ser extrapolados para a população maior.

Dois tipos principais de pesquisas são frequentemente usados:

  • Questionários (pesquisa escrita): A comunicação entre o entrevistador e o entrevistado é mediada pelo questionário, que pode ser autoaplicado (online, por correio) ou administrado por um pesquisador.
  • Entrevistas (pesquisa oral): Envolve contato direto entre o entrevistador e o entrevistado, permitindo maior flexibilidade, esclarecimento de dúvidas e a coleta de informações mais ricas e detalhadas (entrevistas estruturadas, semiestruturadas ou não estruturadas).

Além dos tipos tradicionais, pesquisadores recorrem a tipos menos convencionais de pesquisas. O exemplo do método da "escrita perdida" (lost letter technique) desenvolvido por Stanley Milgram, Leon Mann e Stephen Harter para estudar as atitudes dos eleitores é notável. Eles "perderam" cartas prontas para serem enviadas em diferentes bairros da cidade, endereçadas a várias organizações políticas. Com base na velocidade de recebimento dessas cartas na caixa de correio assinada, os cientistas tiraram conclusões sobre a popularidade das organizações políticas entre a população. Este é um exemplo criativo de pesquisa empírica que tenta contornar os vieses de autorrelato.

 4. Investigação aplicada: o programa e o plano de pesquisa

A eficácia da pesquisa aplicada na ciência política depende fundamentalmente de um planejamento meticuloso. O processo de preparação do estudo inclui o desenvolvimento adequado do programa e do plano de pesquisa.

4.1. O Programa de Pesquisa

O programa de pesquisa é a apresentação e justificativa dos fundamentos teóricos e metodológicos do trabalho planejado e dos métodos de sua organização. Ele serve como um roteiro detalhado para todo o processo de investigação. O programa, via de regra, é composto por duas partes:

a) Seção Metodológica:

A seção metodológica estabelece as bases conceituais e lógicas do estudo:

  • Formulação do problema de pesquisa: Compreender uma situação contraditória que afeta os interesses das pessoas, mas que é pouco estudada. Podem ser problemas epistemológicos (falta de conhecimento sobre fenômenos) ou objetivos (contradições ou conflitos entre grupos, instituições). O problema científico é formado na encruzilhada de uma situação problema real e a visão do pesquisador.
  • Definição do objeto de pesquisa: O portador da situação problema, que é o foco principal do estudo (ex: sistema político brasileiro, comportamento eleitoral).
  • Definição do assunto de pesquisa: Certas propriedades, aspectos e traços característicos do objeto de pesquisa que serão investigados (ex: o impacto da polarização no comportamento eleitoral).
  • Definição do propósito do estudo: Qual resultado, teórico cognitivo (gerar conhecimento) ou prático aplicado (resolver um problema), o pesquisador busca obter.
  • Escolha das variáveis: Características fatoriais variáveis do objeto de estudo.
    • Variáveis independentes: Causas de fenômenos ou mudanças (ex: nível de desenvolvimento econômico).
    • Variáveis dependentes: Consequências condicionadas por causas externas (ex: tipo de regime político). A identificação de variáveis é crucial para a criação de um modelo multidimensional e a identificação de inter-relações estáveis.
  • Interpretação e operacionalização dos conceitos principais: Definir conceitos abstratos em termos concretos e mensuráveis. Por exemplo, "Estado" ou "partido" são mais fáceis de interpretar, enquanto "cultura política" ou "regime político" exigem maior esforço para serem operacionalizados em indicadores empíricos verificáveis. A operacionalização é o esclarecimento de conceitos concretizadores e sua correlação com dados empiricamente verificáveis.
  • Desenvolvimento de hipóteses de trabalho: Pressupostos sobre um conjunto de unidades de pesquisa ou sobre a estrutura de objetos sociais que serão testados empiricamente. (Mais detalhes sobre hipóteses e teorias serão dados na seção 2.7).

b) Seção Processual:

A seção processual detalha como a pesquisa será conduzida:

  • Plano estratégico de pesquisa: A arquitetura geral da investigação.
  • Definição da população pesquisada: Quem ou o que será estudado (ex: todos os eleitores de um país, todos os documentos de um arquivo).
  • Metodologia de coleta e análise de informações: As técnicas específicas a serem usadas (pesquisas, análise de conteúdo, entrevistas, etc.) e como os dados serão processados.

4.2. Tipos de Planos de Pesquisa

A seção metodológica do programa contém um plano de pesquisa que, dependendo das metas e objetivos do estudo, pode assumir diferentes formas:

  • Plano de Reconhecimento (ou Formulativo): Objetivo é formular problemas e apresentar hipóteses de trabalho. É usado quando o objeto de pesquisa é pouco estudado e há pouca informação sobre ele. Envolve consultas a especialistas, busca de fontes de dados adicionais e métodos exploratórios.
  • Plano Descritivo: Visa o desenvolvimento detalhado de métodos qualitativos e quantitativos pelos quais as características e parâmetros do objeto podem ser estabelecidos. Inclui certas hipóteses e atividades para a coleta de informações primárias (por exemplo, pesquisas de opinião pública sobre um determinado assunto).
  • Plano Analítico e Experimental: Serve ao propósito de determinar as conexões em objetos sociais e a natureza da dependência entre várias características. A utilização deste tipo de plano baseia-se em hipóteses-fundamentos cuidadosamente verificadas e, por vezes, envolve a manipulação de variáveis.
  • Plano Organizacional: De natureza geral, visa uma descrição detalhada do procedimento de pesquisa. Inclui o desenvolvimento de instrumentos de pesquisa (questionários, roteiros de entrevista), a formação de equipes para a coleta de informações primárias, a determinação do local e horário do estudo, a população amostral, medidas para a preparação técnica (reprodução de materiais, informações aos entrevistados), ajuste de hipóteses e métodos após um estudo-piloto, preparação de software para processamento de informações, medidas de processamento informatizado dos resultados, e a generalização e análise dos dados obtidos.

A Tabela 2.1 ilustra como diferentes tipos de pesquisa são combinados com o número de variáveis e unidades de pesquisa:

Número de Variáveis

Número de Unidades

Tipo de Pesquisa

Poucas

Muitas

Censos, Referendos, Estudos Transnacionais

Muitas

Poucas

Estudos de Caso, Levantamentos Monográficos

Essa tabela ressalta a escolha estratégica de métodos: quando se tem muitas variáveis, mas poucos casos (como em estudos de caso), a profundidade é priorizada. Quando se tem poucas variáveis, mas muitos casos (como em censos), a generalização é o foco.

 5. Generalização dos resultados da investigação

Após a realização da pesquisa empírica e a conclusão da coleta e processamento dos dados, inicia-se a etapa crucial de generalização dos resultados obtidos. Existem dois grupos principais de formas de analisar e resumir os resultados: quantitativo e qualitativo.

5.1. Métodos Quantitativos de Análise e Generalização de Dados

Os métodos quantitativos de análise e generalização de dados visam a transformar dados brutos em insights compreensíveis através de ferramentas estatísticas e matemáticas, excluindo a subjetividade. Eles incluem:

  • Classificação ou Agrupamento: É a ordenação dos dados de acordo com uma única característica estatística. A escolha da característica para classificação é feita de acordo com os objetivos do estudo e as hipóteses formuladas. Os agrupamentos podem ser baseados na repartição de grupos nominais (por sexo, nível de qualificação, nacionalidade) ou por alguma característica quantitativa crescente ou decrescente (ex: por nível de renda).
  • Compilação de Tabelas, Construção de Gráficos e Diagramas: Fornecem a melhor maneira de ilustrar visualmente os resultados da pesquisa, tornando os dados complexos mais acessíveis e claros.
  • Coeficiente de Correlação: Permite identificar e quantificar a relação entre duas variáveis. Pode mostrar o grau de identidade das características de grupos comparados (por exemplo, valores ou renda), bem como o grau de inter-relação entre as duas características de um objeto social (por exemplo, a dependência de orientações políticas específicas do valor da renda total).
    • Com o aumento simultâneo das variáveis, a correlação é positiva.
    • Quando o aumento de uma variável está associado à diminuição da outra, a correlação é negativa.
    • Os extremos do coeficiente de correlação são +1 (correlação positiva perfeita, identidade) e -1 (correlação inversa completa, onde o valor de uma característica é máximo quando a outra é mínima). Um coeficiente próximo de zero indica pouca ou nenhuma correlação linear.
  • Análise de Regressão: Permite revelar a natureza da relação entre as variáveis de forma mais profunda, a partir da qual é possível estabelecer a natureza e a forma da dependência do atributo efetivo (variável dependente) em relação aos explicativos (variáveis independentes). É uma ferramenta poderosa para inferir causalidade (embora correlação não seja causalidade) e fazer previsões.
  • Análise Fatorial: Facilita a determinação do grau de interconexão entre variáveis diretamente não observáveis (fatores latentes) e características empiricamente observáveis (variáveis manifestas). Por exemplo, em uma pesquisa, várias perguntas sobre "confiança nas instituições" podem ser combinadas para medir um fator latente de "confiança política".

Os métodos quantitativos de análise e generalização de dados permitem obter dados suficientemente precisos e objetivos, para excluir a subjetividade e a parcialidade do processo de pesquisa. Portanto, sua importância na ciência política não pode ser superestimada, especialmente para a construção de generalizações empíricas e o teste de hipóteses causais.

5.2. Métodos Qualitativos de Análise e Generalização de Dados

Nos últimos anos, os cientistas começaram a prestar mais atenção aos métodos qualitativos de análise, uma vez que estes permitem uma penetração mais profunda na essência dos fenômenos em estudo, revelar as relações sociais, mostrar a dependência de algumas variáveis em relação a outras e apresentar o mundo social não em uma dimensão unidimensional, mas multidimensional. Eles são cruciais para compreender o "porquê" e o "como" dos fenômenos, as motivações, os significados e os processos sociais.

Os métodos qualitativos de análise e generalização de dados incluem:

  • Criação de Tipologias (Tipologização): É um método de agrupamento de objetos de acordo com características empiricamente ou logicamente selecionadas ou suas combinações. A importância desse método de análise teórica reside na ordenação e sistematização dos dados da pesquisa, propriedades estudadas e características dos objetos sociais. Permite vincular a pesquisa empírica com sua explicação teórica. As tipologias são criadas em função das questões levantadas pelo investigador e são moldadas pela imaginação do cientista, o que explica a multiplicidade de tipos para um mesmo assunto.
    • Requisitos para a Construção de Tipologias:
      1. A tipologia deve ser criada com base em conceitos, e não apenas em fatos empíricos brutos.
      2. A tipologia deve ser criada com base em variáveis que tenham significado cognitivo e relevância para o problema de pesquisa.
      3. Os objetos em estudo devem ser descritos por um conceito claro.
      4. A tipologia deve ser explicativa, ou seja, capaz de iluminar as causas ou consequências dos fenômenos.
      5. A tipologia deve combinar características de ordem empírica e lógica, conectando o observável com o conceitual.
  • Modelagem (Qualitativa): Embora a modelagem também possa ser quantitativa, no contexto qualitativo, refere-se à criação de representações simplificadas da realidade para entender interconexões complexas, processos e fluxos. Isso inclui modelos conceituais, diagramas de fluxo, mapas cognitivos de atores políticos, etc.
  • Criação e Desenvolvimento de Teorias (Grounded Theory): Envolve a construção de teorias diretamente a partir dos dados qualitativos, através de um processo iterativo de coleta, codificação e análise, permitindo que as categorias e conceitos emerjam da própria pesquisa, em vez de serem impostos a priori.
  • Previsão Política (Qualitativa): Embora haja previsões baseadas em modelos quantitativos, a previsão qualitativa envolve a análise de cenários, o uso de expertise e a identificação de tendências emergentes para antecipar desenvolvimentos políticos.

A combinação de métodos quantitativos e qualitativos (abordagem de métodos mistos) é cada vez mais valorizada na ciência política, pois permite que os pesquisadores aproveitem os pontos fortes de ambos os enfoques para uma compreensão mais completa e robusta dos fenômenos políticos.

 6. Metodologia dos estudos comparativos em ciência política

Aprofundando no método comparativo, que já mencionamos como um dos métodos teóricos, sua metodologia é central para a Ciência Política Comparada. O método comparativo envolve o estudo de semelhanças e diferenças entre fenômenos ou suas classes para identificar padrões, causas e consequências. A primeira sistematização do método comparativo para as ciências sociais foi desenvolvida por John Stuart Mill (1806-1873) em sua obra A System of Logic, através de seus "Cânones de Mill".

Os Cânones de Mill, adaptados para a ciência política, são ferramentas lógicas para a inferência causal através da comparação de casos:

  • Método de Acordo (Método da Concordância): Se em dois ou mais casos de um fenômeno sob investigação, uma circunstância em particular é comum a todos eles, essa circunstância é a provável causa (ou efeito) do fenômeno.
    • Exemplo:
      • Caso Empírico 1: País X (democracia estável), Características: A (sociedade civil forte), B, C
      • Caso Empírico 2: País Y (democracia estável), Características: A (sociedade civil forte), D, E
      • Caso Empí 3: País Z (democracia estável), Características: A (sociedade civil forte), F, G
    • Conclusão: A é a única característica comum onde X (democracia estável) é o resultado. Portanto, A (sociedade civil forte) pode ser a causa de X.
    • Este método busca casos que são diferentes em muitos aspectos, mas semelhantes no resultado e em uma única causa potencial comum.
  • Método da Diferença (Método da Variação Concomitante para poucos casos): Se em dois casos um fenômeno ocorre quando uma certa circunstância está presente, e não ocorre quando essa circunstância é removida, mantendo todas as outras circunstâncias iguais, então essa circunstância é a causa (ou parte da causa) do fenômeno.
    • Exemplo:
      • Caso Empírico 1: País X (reforma econômica bem-sucedida), Características: A (apoio político), B, C
      • Caso Empírico 2: País Y (reforma econômica não-sucedida), Características: ¬A (falta de apoio político), B, C
    • Conclusão: A é a diferença encontrada entre dois casos idênticos em que X (reforma bem-sucedida) ocorre ou não. Portanto, A (apoio político) pode ser a causa de X.
    • Este método busca casos que são semelhantes em muitos aspectos, mas diferem em uma única causa potencial e no resultado.
  • Método de Variações Concomitantes (para muitos casos): Se um fenômeno varia de alguma maneira particular, e uma circunstância com a qual ele está conectado varia da mesma maneira, então essa circunstância é a causa (ou parte da causa) do fenômeno.
    • Exemplo:
      • O valor de A (índice de polarização política) muda.
      • A magnitude de X (índice de instabilidade governamental) muda com a magnitude de A.
    • Conclusão: A (polarização) pode ser a causa de X (instabilidade).
    • Este método é mais aplicável a grandes "N" (grande número de casos) e é a base para a análise correlacional e regressão em estudos quantitativos.

6.1. Tipos de Explicações em Estudos Comparativos (Segundo S. Huntington)

Samuel P. Huntington identificou vários tipos de explicações que podem ser buscadas em estudos comparativos, mostrando a complexidade das relações causais na política:

  • Tipo 1: Causa Única (Causa e Efeito Semelhantes): Uma certa causa (L), que surgiu em vários países, pode iniciar consequências semelhantes neles.
    • Lógica: O mesmo fenômeno pode ser a causa de consequências semelhantes em vários sistemas políticos.
    • Exemplo (Fig. 2.2, a): A existência de forte tradição autoritária (L) em diversos países levou ao surgimento de regimes populistas (X) neles.
  • Tipo 2: Causas Semelhantes em Condições Semelhantes (Causas Contextuais): Causas semelhantes em condições semelhantes (contextos) causam consequências semelhantes em casos diferentes. Aqui, o contexto é crucial.
    • Lógica: Não apenas a causa, mas o ambiente em que ela opera é determinante.
    • Exemplo (Fig. 2.2, b): A introdução de reformas econômicas neoliberais (causa semelhante) em países com instituições democráticas consolidadas (condições semelhantes) levou a resultados de estabilidade econômica (consequências semelhantes).
  • Tipo 3: Eventos em um Sistema Podem Iniciar Consequências Semelhantes em Outros (Difusão/Contágio): Eventos em um sistema político podem iniciar consequências semelhantes em outros. Isso se refere a fenômenos de difusão, contágio ou aprendizado político.
    • Lógica: Um evento em um local pode ter um efeito de cascata ou mimetismo em outros.
    • Exemplo (Fig. 2.2, c): A queda de um regime autoritário na Europa Oriental (evento em um sistema) pode ter inspirado e acelerado movimentos democratizadores em outros países da região (consequências semelhantes em outros sistemas).

Esses tipos de explicação de Huntington destacam que a causalidade política raramente é linear ou simples, muitas vezes envolvendo múltiplos fatores, condições contextuais e interdependências.

 7. Hipóteses e teorias na pesquisa política

Para que a pesquisa política seja claramente organizada e cientificamente rigorosa, é fundamental apresentar hipóteses de trabalho.

7.1. Hipóteses

Hipóteses são pressupostos sobre um determinado conjunto de unidades de pesquisa ou sobre a estrutura de objetos sociais, que são confirmados ou refutados no decorrer da pesquisa. O papel de uma hipótese é ordenar conceitualmente os objetos em estudo, fornecendo uma direção e um foco para a investigação. Portanto, sem o seu desenvolvimento, é impossível realizar pesquisas científicas sérias. Ao desenvolver um programa de pesquisa, via de regra, várias hipóteses são formuladas para guiar a coleta e a análise dos dados empíricos.

Para que uma hipótese "funcione" e seja útil para a pesquisa, ela deve atender a certos requisitos:

  1. Ser determinística: Associada ao maior número possível de observações e indicadores empíricos, permitindo sua testabilidade.
  2. Respeitar o princípio da falseabilidade: Ou seja, ser logicamente verificável e correlacionada com hipóteses alternativas. Isso significa que deve ser possível, em princípio, encontrar evidências que a refutem. Uma hipótese que não pode ser falseada (refutada) por dados empíricos não é uma hipótese científica válida (princípio de Karl Popper).
  3. Ser verificável (testável): Deve ser possível estabelecer as áreas de sua verdade, falsidade e neutralidade através de dados empíricos. Os conceitos usados na hipótese devem ser empiricamente verificáveis, ou seja, operacionalizáveis.
  4. Ter caráter comunicativo: Estar conectada com outras hipóteses e corresponder em conteúdo, aparato conceitual e ferramentas à área disciplinar em que é criada, facilitando o diálogo e a acumulação de conhecimento.
  5. Ser coerente: Suas disposições não devem contradizer-se entre si, bem como os fatos científicos previamente verificados e confirmados. A lógica interna da hipótese deve ser sólida.
  6. Ser limitada: Deve minimizar tolerâncias e restrições excessivas, sendo precisa e específica o suficiente para ser testável.

7.2. Teorias

As hipóteses são os degraus que levam à construção de teorias. Como mencionado, a teoria (do grego theoria, "visão", "contemplação") é a forma mais elevada de conhecimento. Na ciência política, uma teoria é um conjunto de proposições inter-relacionadas que busca explicar um fenômeno político de forma sistemática, coerente e com poder de generalização. Ela vai além da descrição de fatos, buscando explicar "porquê" e "como" os eventos políticos ocorrem.

As teorias cumprem várias funções cruciais:

  • Organização e Sistematização: As teorias organizam o conhecimento disperso em um corpo coerente.
  • Explicação: Fornecem explicações para os fenômenos políticos, identificando relações causais e lógicas.
  • Previsão: Permitem a formulação de previsões sobre eventos futuros ou sobre o comportamento de atores em certas condições.
  • Orientação para Pesquisa: Sugerem novas questões e áreas para investigação empírica, guiando a formulação de novas hipóteses.
  • Heurística: Estimulam o pensamento e a descoberta de novas conexões.

As teorias políticas podem variar em seu nível de abstração, de microteorias focadas em comportamentos individuais a microteorias que explicam grandes sistemas ou processos históricos. A construção e o refinamento de teorias são o objetivo final da pesquisa científica em política, pois são elas que nos permitem compreender e, potencialmente, moldar o mundo político de forma mais eficaz.

 A Abordagem integrada na ciência política

A ciência política, em sua jornada para compreender as complexidades do poder, da governança e da interação humana, desenvolveu e aperfeiçoou uma rica tapeçaria de métodos. Desde os métodos lógicos gerais que formam a espinha dorsal do pensamento científico (abstração, análise, síntese, indução, dedução, analogia, modelagem, classificação e idealização), passando pelos métodos teóricos que constroem arcabouços explicativos (sistemas, estrutural-funcionalismo, comunicação, comparação), até os métodos empíricos que coletam e analisam dados do mundo real (observação, análise documental, avaliação de especialistas, surveys), a disciplina se equipou para uma investigação rigorosa.

A distinção entre o "o que é" (fatos) e o "o que deveria ser" (valores) é uma tensão constante, mas a ciência política moderna reconhece a natureza axiológica inerente à sua área, buscando integrar valores na estrutura da pesquisa para maior relevância. A preparação meticulosa da investigação, através de um programa e plano de pesquisa bem definidos, é crucial para a obtenção de resultados válidos, sejam eles para o avanço do conhecimento teórico ou para a aplicação prática.

Finalmente, a generalização dos resultados, seja através de métodos quantitativos que buscam padrões e correlações estatísticas, ou de métodos qualitativos que aprofundam a compreensão de significados e processos, é o passo final para transformar dados em conhecimento significativo. A formulação de hipóteses testáveis e a construção de teorias robustas são o coroamento desse processo, permitindo que a ciência política não apenas descreva o mundo, mas o explique e, em última instância, forneça insights para sua melhoria.

A dinâmica contínua entre teoria e empiria, a capacidade de integrar diferentes abordagens e a constante busca por refino metodológico são o que tornam a ciência política uma disciplina vibrante e essencial para a compreensão dos desafios e oportunidades de um mundo em constante mudança. Ao dominar esses métodos, os cientistas políticos estão mais aptos a desvendar a verdade objetiva subjacente aos fenômenos políticos, contribuindo para uma cidadania mais informada e uma governança mais eficaz.

 

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