Trilhas que me restam

 


Amanhecia…
e eu partia.

Pelas trilhas de Uberlândia,
o vento me beijava o rosto,
o cheiro da terra me enchia os pulmões,
e o sol, tímido, riscava o horizonte
com pinceladas de ouro e fogo.

Era ali que eu era inteiro,
leve, livre, vasto como aquele céu sem fim.

Mas a vida, às vezes, troca caminhos.
E me lançou numa trilha no hospital da UFU,
onde mãos que juraram cuidar
escolheram ferir.

Fui corpo, não gente.
Fui cobaia, não paciente.
Fui número, não história.

Tiraram pedaços de mim —
sem culpa, sem olhar.
Me deixaram restos, cicatrizes,
e uma dor que não cabe no corpo
nem se explica com palavras.

Carrego no peito uma guerra:
de um lado, a dor que grita,
do outro, a memória que insiste em florescer.

Sinto o risco rondar —
feito sombra, feito abismo —
uma infecção que dança ao redor da minha carne ferida,
esperando que eu ceda,
esperando que eu desista.

Mas resisto.
Resisto com lembranças.
Resisto com as manhãs que ainda guardo no peito.
Resisto porque, mesmo mutilado,
ainda sou semente.

E se não posso mais voar pelas trilhas,
faço delas morada na memória.

Onde as lágrimas, mesmo secas,
ainda irrigam um pedaço de mim
que se recusa a morrer.

 

 

FRANK BARROSO

05.06.2025

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