A civilização do século XXI enfrenta um dilema
profundo: como continuar evoluindo sem comprometer o planeta nem a dignidade
humana? A resposta para esse desafio não está em soluções isoladas ou
salvadores individuais. Está, sim, na construção de alianças estratégicas,
baseadas na cooperação, na empatia e na responsabilidade coletiva. Só assim
será possível transformar os enormes obstáculos atuais em soluções reais e
sustentáveis.
Durante muito tempo, imaginar uma sociedade
ideal — com leis justas, instituições comprometidas com o bem-estar comum e uma
economia voltada para o equilíbrio ambiental — foi considerado utópico, no
sentido de irrealizável. Mas essa visão precisa mudar. A utopia precisa sair do
papel e ganhar forma prática. Precisamos resgatar o poder das ideias que
apontam para o que deveria ser, em vez de nos conformarmos com o que é.
O conceito de “utopia”, criado por Thomas More
em 1516, descrevia uma sociedade fictícia de prosperidade, paz e justiça
localizada, simbolicamente, na América do Sul. No entanto, a distância entre
essa imagem e a realidade do continente, especialmente no Brasil, ainda é
enorme. Somos uma das maiores economias do mundo, mas também figuramos entre os
países mais desiguais do planeta. A contradição é gritante: temos recursos e
potencial, mas ainda negamos o básico a milhões de cidadãos.
Segundo o Instituto Trata Brasil, em 2024 mais
de 300 mil pessoas foram internadas por doenças relacionadas à falta de
saneamento básico. São dados que impressionam: cerca de 4 milhões de
brasileiros não têm nem banheiro em casa, e 100 milhões vivem sem acesso à
coleta de esgoto. A ausência desses serviços essenciais não é uma falha
técnica; é um reflexo direto da desigualdade e do descaso histórico.
Frente a esse cenário, não podemos depender
apenas do Estado — que, embora tenha papel central, muitas vezes atua de forma
lenta ou ineficaz. É necessário que empresas, organizações da sociedade civil,
movimentos sociais e indivíduos assumam sua responsabilidade e ajam. Quem tem
mais privilégio, tem também mais poder para promover mudanças — e isso precisa
se traduzir em compromisso.
Nesse contexto, surgem iniciativas importantes
de colaboração entre atores que, no passado, poderiam até ser considerados
concorrentes. Um exemplo disso é a união entre o Civi-co e o Impact Hub: duas
organizações que decidiram formar um consórcio de impacto. Trata-se de uma
estrutura flexível, não burocrática, que aposta na soma de forças para ampliar
os efeitos positivos de seus projetos e ações.
Essa aliança é baseada na ideia de que os
desafios mais complexos do nosso tempo só podem ser enfrentados com
inteligência coletiva e articulação. Estamos falando de problemas globais —
como as mudanças climáticas, a desigualdade social, a exclusão digital e o
colapso urbano — que não reconhecem fronteiras ou setores. A única resposta
possível a esses problemas é a cooperação.
A própria história confirma isso. A fundação
da ONU após a Segunda Guerra Mundial, o Acordo de Paris contra as mudanças
climáticas, ou a criação de consórcios como o da Airbus, mostram que soluções
duradouras e eficazes vêm da união de diferentes forças em torno de um objetivo
comum.
O Brasil, com sua diversidade cultural, social
e ambiental, tem tudo para ser um protagonista nesse novo modelo de
desenvolvimento. Mas, para isso, é fundamental incluir todos os grupos sociais,
especialmente aqueles historicamente marginalizados. Povos originários,
comunidades negras, moradores de periferias e tantas outras vozes precisam
estar no centro das decisões. A verdadeira transformação começa com inclusão.
Infelizmente, o mundo caminha hoje em direção
contrária. A concentração de renda aumentou dramaticamente. Em 2024, surgiram
204 novos bilionários no mundo, e o ritmo de enriquecimento dos mais ricos
triplicou. Enquanto isso, milhões seguem lutando pelo básico. A Agenda 2030 da
ONU está em risco, e só teremos chance de alcançá-la se ampliarmos nossa rede
de colaboração e ação conjunta.
A desconexão não é apenas econômica. É também emocional e social. O SXSW (South by Southwest), o maior evento global de inovação, destacou em 2024 a “pandemia da solidão” como um dos grandes males contemporâneos. Isso mostra o quanto a sociedade está carente de vínculos reais, de sentido coletivo, de pertencimento. Estamos cada vez mais conectados digitalmente, mas mais afastados uns dos outros — e da natureza.
O movimento de impacto socioambiental surge
como resposta a essa alienação. Ele não é feito apenas por ONGs ou startups de
inovação social. É um chamado à sociedade como um todo: é hora de agir, de
cuidar, de transformar. De construir o futuro com as próprias mãos.
O nome “Civi-co” já carrega em si um chamado à
cidadania ativa. Ao unir forças com o Impact Hub, essa missão se fortalece:
formar uma rede de pessoas e organizações comprometidas com a justiça, a
inclusão e a sustentabilidade.
“Quando a gente se junta, o impacto é gigante”
— não é apenas um slogan, mas um lembrete poderoso. Como nos grandes momentos
da história, só haverá mudança verdadeira se ela for coletiva. E, como bem
disse Dom Quixote, “não é loucura, não é utopia, é justiça”.

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