A profundidade da tristeza

 


Eu tinha 16 anos. Era inquieto, intenso, vivia os corredores da escola com o peito cheio de sonhos e as mãos carregadas de papéis, discursos, panfletos. Era um líder estudantil. Mas por dentro, a liderança era apenas uma máscara que tentava esconder um buraco: eu não me sentia amado.

Naquela tarde — lembro bem — alguém em quem eu confiava profundamente virou-se para mim e disse: “não confie”. A frase bateu como um tapa. Como confiar no mundo se nem aqueles a quem ofereço o coração me devolvem a mínima esperança?

Não foi a primeira vez. Na minha curta vida até ali, eu já havia dito "eu te amo" algumas vezes. Mas nunca pareciam acreditar. Havia algo no meu rosto, no meu jeito, talvez até no meu silêncio — algo que gritava traição aos olhos dos outros, mesmo sem intenção. Como se estivesse marcado com um sinal invisível que dizia: "não confie nele".

Aos dezesseis anos, a solidão era uma companheira fiel. Havia uma menina que me via de verdade, que queria ser minha amiga. Mas o mundo, com suas mãos frias e seus preconceitos ferozes, impediu que ela se aproximasse. Tiraram dela o direito de me amar, e de mim, a chance de ser aceito.

Foi naquele momento que escrevi: “Hoje meu coração é mais triste que amor”. E era. Porque a coisa mais amarga que se pode sentir é a profundidade da tristeza. Ela tem gosto de ferro, de lágrima seca, de vida que murcha por dentro.

Mesmo com a juventude pulsando nas veias, eu sentia o peso da ausência. Ausência de afeto, de abraço, de um olhar que dissesse: "você importa". E eu continuei procurando aquela amiga que um dia quase tive. A que me entenderia, a que seguraria minha mão e diria: “Deixe a tristeza de lado e venha comigo.”

Décadas se passaram. Hoje sou geógrafo, jornalista — um homem que viu o mundo, escreveu sobre ele, denunciou, sonhou. Mas agora, mutilado por erros médicos após um acidente, experimento novamente o mesmo gosto amargo da juventude. A mesma frieza da solidão. A mesma pergunta sem resposta: por que é tão difícil ser amado do jeito que a gente é?

A vida tem dessas ironias. A dor da juventude, que parecia coisa de adolescente sensível, volta na maturidade como um velho conhecido. E mais uma vez me pego desejando aquela amiga de mãos quentes e palavras simples. Alguém que diga, sem medo, sem juízo, sem muralhas:

"Eu sou sua amiga. Deixe a tristeza de lado e venha comigo."

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