A justiça climática é um conceito que coloca a equidade e os
direitos humanos no centro da tomada de decisões e das ações sobre as mudanças
climáticas. Isso significa que a abordagem da crise climática deve considerar
quem é mais afetado, quem tem mais responsabilidade histórica pela emissão de
gases de efeito estufa e como essas desigualdades podem ser corrigidas. A
justiça climática surge como uma resposta à percepção de que as mudanças
climáticas não afetam a todos de maneira igual e que as comunidades mais
vulneráveis e menos responsáveis pela crise são as que mais sofrem seus
impactos.
Ao longo deste artigo, exploraremos as várias facetas da
justiça climática, por que ela é fundamental para a luta contra as mudanças
climáticas, e os desafios que enfrentamos para alcançá-la.
1. Desigualdade na responsabilidade pela crise climática
A justiça climática reconhece a responsabilidade histórica
desigual que diferentes países e indústrias têm em relação à crise climática. O
conceito sugere que as nações e empresas que mais contribuíram para o aumento
das emissões de gases de efeito estufa têm a obrigação de ajudar as comunidades
que sofrem as consequências das mudanças climáticas. Países ricos, que
industrializaram suas economias emitindo grandes quantidades de poluentes,
enriquecendo nesse processo, devem assumir um papel ativo na mitigação dos
impactos climáticos, particularmente nas regiões mais vulneráveis, que
frequentemente são as que menos contribuíram para o problema.
Estudos indicam que os 10% mais ricos da população mundial
são responsáveis por cerca de 34-45% das emissões globais, enquanto os 50% mais
pobres contribuem com apenas 13-15%. Essa disparidade revela a profundidade da
injustiça climática, em que os maiores poluidores acumulam benefícios, enquanto
as populações vulneráveis, especialmente nos países de baixo rendimento, sofrem
os danos.
2. Desigualdades estruturais e impactos diferenciados
Mesmo dentro de um único país, as mudanças climáticas afetam
as populações de maneira desigual, com base em fatores como raça, etnia, gênero
e condição socioeconômica. Por exemplo, as mulheres frequentemente são mais
afetadas pelas alterações climáticas, pois possuem menos recursos para se
adaptar às mudanças abruptas, especialmente em comunidades rurais e países em
desenvolvimento. Além disso, pessoas com deficiência enfrentam maiores desafios
em termos de segurança alimentar, saúde e saneamento devido às barreiras
adicionais impostas por desastres climáticos.
Os povos indígenas, que protegem cerca de 80% da
biodiversidade global, também são desproporcionalmente impactados pelas
mudanças climáticas. A degradação de seus territórios e recursos naturais
ameaça não apenas seus meios de subsistência, mas também seus conhecimentos
tradicionais, fundamentais para a preservação ambiental.
3. Iniquidade intergeracional
Outro aspecto crucial da justiça climática é a iniquidade
intergeracional. As crianças e jovens de hoje herdarão as consequências das
decisões tomadas pelas gerações anteriores, sendo forçados a lidar com os
impactos mais severos da crise climática. Embora não tenham contribuído
significativamente para o problema, os jovens enfrentarão uma realidade marcada
por desastres climáticos mais frequentes e intensos, com impactos duradouros em
sua saúde, segurança alimentar e qualidade de vida.
A justiça climática, portanto, não é apenas uma questão de
equidade entre países ou classes sociais, mas também entre gerações. As ações
climáticas atuais devem garantir o direito das gerações futuras a um planeta
habitável, promovendo uma transição sustentável que proteja seus direitos
humanos.
4. A relação entre mudanças climáticas e direitos humanos
A crise climática é, acima de tudo, uma questão de direitos
humanos. As mudanças climáticas estão diretamente ligadas a perdas de vidas,
destruição de culturas e ameaças à subsistência de milhões de pessoas. O
aumento das temperaturas e a maior frequência de eventos climáticos extremos
contribuem para a falta de acesso a recursos essenciais como água e alimentos,
gerando deslocamentos forçados, conflitos e desnutrição.
Além disso, a crise climática agrava problemas de saúde
pública, expondo as populações vulneráveis ao estresse térmico, surtos de
doenças, poluição do ar e traumas decorrentes de desastres naturais. Entre 2010
e 2020, as taxas de mortalidade devido a inundações, secas e tempestades foram
15 vezes maiores em regiões altamente vulneráveis em comparação com áreas de
baixa vulnerabilidade.
A justiça climática busca garantir que todas as pessoas
tenham o direito de viver com dignidade, independentemente de sua localização
geográfica ou condição socioeconômica. Para isso, é necessário criar políticas
climáticas que não apenas mitiguem os efeitos das mudanças climáticas, mas
também abordem as causas estruturais das desigualdades que perpetuam essa
crise.
5. Uma transição justa para um futuro sustentável
A transição para uma economia de baixo carbono, embora
necessária, pode agravar desigualdades se não for feita de forma justa.
Comunidades locais, especialmente trabalhadores informais e populações
marginalizadas, correm o risco de serem prejudicadas durante essa transição,
caso seus direitos não sejam respeitados e suas vozes não sejam ouvidas.
Por exemplo, a mineração de minerais necessários para a
produção de baterias para veículos elétricos tem gerado preocupações crescentes
sobre violações de direitos humanos, especialmente em países do Sul Global. Uma
transição justa requer que essas comunidades sejam consultadas e protegidas,
garantindo que os benefícios da economia verde sejam distribuídos de forma
equitativa e que não criem novos problemas sociais e ambientais.
6. Obstáculos para alcançar a justiça climática
Alcançar a justiça climática enfrenta diversos obstáculos.
Um dos maiores desafios é a falta de transparência e inclusão nos processos de
negociação climática. Muitas vezes, as vozes das mulheres, jovens, povos
indígenas e grupos marginalizados são sub representados ou incluídas de forma
simbólica, sem que tenham real poder de decisão.
Outro obstáculo é a falta de acesso à educação e aos
recursos necessários para entender as ligações entre mudanças climáticas e
direitos humanos. Barreiras linguísticas, econômicas e tecnológicas impedem que
muitas das comunidades mais afetadas participem de forma significativa nas
discussões políticas relevantes.
A repressão a ativistas ambientais é um problema crescente.
Defensores da justiça climática, especialmente em países em desenvolvimento,
frequentemente enfrentam perseguição, violência e até assassinato por exigirem
a proteção dos direitos ambientais e a responsabilização dos grandes emissores.
Em nível global, os países mais vulneráveis têm pressionado
há décadas por maior apoio financeiro dos países ricos para lidar com os
impactos das mudanças climáticas. Apesar de compromissos assumidos, como a
promessa de US$ 100 bilhões anuais em financiamento climático, esses valores
não foram totalmente atingidos, e é necessário um aumento substancial para
enfrentar os crescentes desafios impostos pelo aquecimento global.
A justiça climática é uma abordagem fundamental para
enfrentar a crise climática de forma equitativa e eficaz. Ao reconhecer as
desigualdades históricas, socioeconômicas e intergeracionais, ela coloca os
direitos humanos no centro da ação climática, garantindo que os mais
vulneráveis não sejam deixados para trás. No entanto, para que a justiça
climática seja alcançada, é necessário superar obstáculos como a falta de
inclusão e transparência nas decisões climáticas e a repressão a ativistas
ambientais. Somente com uma abordagem justa e colaborativa será possível
enfrentar os desafios da crise climática e construir um futuro sustentável para
todos.
0 Comentários